Por Renata Winning, para os Jornalistas Livres*
Escrevo na tentativa de criar outra possibilidade às insistentes estatísticas que categorizam em números adolescentes que cometeram ato infracional sem com isso superar o anonimato a que foram submetidos. Não poderei apresentá-los um a um, mas mostrarei traços diferentes do “monstro”, “delinquente”, “bandidinho irrecuperável”. Tentarei apresentar-lhes mais de perto, devolver-lhes a humanidade. Sei que meu tempo é curto. Os noticiários policiais defendendo a redução da maioridade penal têm todos os dias, e eu sou apenas uma psicóloga que trabalhou com adolescentes em conflito com a lei e escreveu um texto, na condição de testemunha, para dizer não à redução da maioridade penal.
Ao contrário do que muitos pensam, os adolescentes que protagonizam noticiários policiais não alcançam a visibilidade. A partir do momento em que são definidos e desumanizados pelo ato infracional que cometeram, dispensa-se a compreensão dos determinantes da violência. A suposta “anormalidade” quando ganha o estatuto de explicação encerra qualquer debate, pois elimina o incômodo de olhar para a exclusão a que estão submetidos. E conhecer a história desses meninos, convenhamos, é um atentado à imagem sagrada da família margarina.
Tratam-se de sujeitos invisíveis: não possuem documentos, não estão na escola, não estão no mercado formal de trabalho, não estão fazendo exames preventivos, apresentam dificuldade de leitura e escrita, não conhecem teatro, museu ou exposição.
